Mulheres com Síndrome de Down: sexualidade, silêncios, silenciamentos e violência

Por

Marina Dias de Faria e Bruna Zeni

Palavras-chave

Sexualidade; Síndrome de Down; Corpo; Tabu; Mulher

A sexualidade de mulheres com deficiência vem sendo encarada como tabu pela sociedade. Trata-se de uma visão quase unânime de que mulheres com deficiência não têm direito a uma vida sexual ativa e nem sequer são donas de seus próprios corpos (Wilkerson, 2011). A investigação que deu origem a esse resumo buscou dar um pequeno passo na tentativa de discutir tal assunto – tão enraizadamente invisibilizado. O objetivo da investigação foi analisar as narrativas sobre a sexualidade das mulheres com Síndrome de Down (SD) a partir dos relatos de mães de pessoas adultas com Síndrome de Down e de profissionais que trabalham diretamente com pessoas com deficiência intelectual em instituições portuguesas. Ressalta-se que alinhamo-nos com a demanda de que sejam articulados gênero e deficiência em estudos comprometidos com, obviamente, a verdade. Qual seja: de que tais pessoas têm desejos sexuais e devem ter direito aos próprios corpos (Siebers, 2008). Para alcançarmos tal objetivo, entrevistamos 16 mães e 10 profissionais. É importante destacarmos que esse relatório é um recorte de uma pesquisa maior, na qual também foram ouvidas pessoas com Síndrome de Down, de modo que pudéssemos observar e respeitar o protagonismo delas nas suas próprias narrativas de vida. Entretanto, a maioria das mães pediu, na ocasião das entrevistas, que não perguntássemos nada sobre sexo ou sexualidade para seus filhos e suas filhas. Segundo essas mães, trata-se de um “tema delicado” ou de “algo que ela nem sabe que existe e é melhor não despertar”. Pedidos que nos fornecem indicativos importantes de como a sexualidade das pessoas com Síndrome de Down tem sido tratada no seio familiar: como um tabu. Sabemos que seria muito importante ter os relatos das pessoas com SD, mas diante desse indicativo e de outros mais obtidos com as profissionais, optamos por fazer um recorte menor, até para darmos conta da proposta de forma satisfatória. Mas ressaltamos, mais uma vez, que se trata da análise da perspectiva de terceiros sobre a sexualidade das mulheres com SD. Os resultados nos mostraram que o silêncio é a norma. As participantes da pesquisa, principalmente as mães, ficaram visivelmente incomodadas de falar sobre o tema e, quando falaram, disseram que as mulheres com Síndrome de Down não são independentes no que diz respeito aos seus próprios corpos. Por parte das organizações, uma das profissionais relatou que a instituição oferecia aulas de educação sexual para as pessoas com SD, mas os pais foram contra e pediram para que as aulas fossem interrompidas. Situações como essas reforçam que são terceiros que determinam, sem demonstrar interesse em ouvir as mulheres com SD, que elas não possuem desejo sexual. Cabe o destaque de que na pesquisa também ficou claro que, por mais que os homens com SD também sofram com visões preconceituosas a respeito de sua sexualidade, são as mulheres que têm seus corpos completamente raptados e seus desejos sexuais silenciados, ignorados e negados veementemente. Uma das consequências graves da negação ao direito básico pelos seus corpos é o alto número de violência sexual sofrida pelas mulheres com Síndrome de Down. Outra consequência é o rótulo socialmente atribuído a essas mulheres de eternas crianças.